O Senado aprovou na noite de quarta-feira, por 54 votos a 13, o projeto que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental e cria um novo marco legal para a regularização de atividades econômicas e empreendimentos. As mudanças são criticadas por ambientalistas e pela ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva. Mas apoiadas por representantes do agronegócio, outros ministérios interessados em destravar obras, e pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que apresentou uma emenda ao texto propondo uma licença especial para “atividades ou empreendimento estratégicos” definidos pelo Conselho de Governo.
O projeto precisa voltar para a Câmara. No plenário, governistas se mostraram contrários ao texto, e o PT orientou contra o projeto. Defensores da mudança dizem que o texto desburocratiza o licenciamento ambiental.
— Àqueles que desejam que o Brasil siga com cinco mil obras paralisadas, quero manifestar o meu apoio ao debate feito por quase dois anos nesta Casa pelo aprimoramento de uma legislação que possa destravar o país — afirmou Alcolumbre, antes da votação. — Temos ferrovias, hidrovias e o setor de mineração inviabilizados por um arcabouço de regras e burocracias.
‘Total discordância’
À tarde, Marina havia dito em São Paulo ter “total discordância” com o projeto e alertou que as mudanças ameaçam compromissos climáticos do Brasil e acordos comerciais, como o negociado entre o Mercosul e a União Europeia.
— É um sinal trocado sendo passado. E o governo está muito preocupado com tudo isso — disse Marina, afirmando que o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), negociava para impedir retrocessos.
Mas a articulação política do governo não interferiu na tramitação do projeto, que já havia sido apoiado por ministérios como o da Casa Civil, Agricultura e Transportes. Na véspera da votação, a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, se reuniu com senadores líderes do MDB, União, PSD, PSB e PDT. Segundo presentes ao encontro, em nenhum momento Gleisi pediu para o projeto ser barrado nem mencionou o assunto. Procurada, Gleisi não se manifestou.
Uma das principais mudanças na proposta substitui o licenciamento em três etapas por uma só licença. Outra alteração prevê que, no lugar de um estudo de impacto ambiental, empreendedores poderão emitir uma licença por adesão de compromisso, que dispensa a necessidade de análise detalhada por parte dos órgãos ambientais — exceto as atividades de alto impacto ambiental.
Pelo novo texto, também passa a valer a renovação automática das licenças ambientais de atividades consideradas de baixo ou médio potencial poluidor. Atualmente, empreendedores precisam revalidar periodicamente as suas licenças.
Mas houve endurecimento das penas para quem construir ou reformar obras ou serviços poluidores sem licença ambiental. Ela saltará de um a seis meses de prisão para seis meses a dois anos de prisão ou multa, ou ambas cumulativamente. A pena poderá dobrar, caso o licenciamento do empreendimento seja sujeito ao Estudo Prévio de Impacto Ambiental.
A emenda de Alcolumbre pode acelerar o processo de exploração de petróleo e gás na Margem Equatorial, na costa do Amapá e do Pará, defendida pelo senador. Nesta semana, o Ibama autorizou a Petrobras a simular o resgate de animais na região da Foz do Amazonas, último passo antes da licença ambiental para prospectar petróleo e gás nesta área do Atlântico. Em fevereiro, o órgão foi criticado por Lula na demora de autorização da pesquisa pela estatal na região, que definiu como “lenga-lenga”. A mudança sugerida pelo presidente do Senado foi criticada por entidades como o Observatório do Clima e o Greenpeace. Mas a posição de Marina e de outros ambientalistas foi contestada pelo consultor de Meio Ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, Rodrigo Justos, para quem a nova regra não abre margem para mais desmatamento.
— A lei em vigor tem 44 anos e precisa ser reciclada. O excesso de rigidez é fruto da exigência de duplicidade de procedimentos — defendeu Justus. — Se algo não pode ser licenciado, que se negue de uma vez.
O projeto pode também afetar obras do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo Lula. Como o asfaltamento da BR-319, única ligação terrestre de Manaus com o resto do país, e a Ferrogrão, entre o Porto de Miritituba, no Pará, e Sinop, no Mato Grosso. No ano passado, a seca formou uma gigantesca fila de caminhões na BR-319, que não conseguiam atravessar de balsa em um de seus trechos em Careiro da Várzea, o que ameaçou o abastecimento de Manaus.