Cazuza era mesmo exagerado — e é no Leblon, onde a brisa do mar se mistura com o burburinho das ruas, que vai acontecer uma experiência que é um convite para sentir o Rio do jeito que Cazuza sentia: intenso e visceral. A partir de quinta-feira, a exposição “Cazuza exagerado” vai ocupar mais de 1.500 metros quadrados no terraço do Shopping Leblon, no bairro que foi palco e inspiração de parte de sua vida. A mostra promete reviver, de forma inovadora e sensorial, a trajetória do poeta que não teve medo de mostrar todas as suas caras.
— Ele morou no Leblon dos 11 aos 21 anos, quase em frente à praça que hoje leva o seu nome. Gostava dos restaurantes do Baixo Leblon, como o Real Astoria e a Pizzaria Guanabara. Saía quase todas as noites. Outro lugar que adorava era o Antiquarius, que frequentava com os pais. A turma dele incluía grandes amigos como Lobão, Serginho (ex-namorado), Bebel Gilberto, Caetano, Dedé (ex-mulher do Caetano) — relembra Lucinha Araújo, mãe e guardiã da memória de Cazuza.
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A exposição vai além de fotos e objetos. É um mergulho na história de Agenor de Miranda Araújo Neto, uma personalidade que não tinha medo de ser demais nas letras, na vida e na maneira de se jogar no palco. Entre as esquinas do Leblon e as mesas da Pizzaria Guanabara recriadas, será possível caminhar pela vida do artista, ouvir suas músicas e relembrar toda a sua trajetória.
Cazuza: fotos raras do artista são reveladas em livros
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Cazuza diante de sua máquina de escrever, em casa, em fotografia de 1988 — Foto: Reprodução/Marcos Bonisson
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Cazuza, aos 20 anos, em imagem de seu passaporte — Foto: Reprodução/Acervo Lucinha Araujo
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Imagem de Cazuza criança, aos 4 anos, em 1962, na Praia de Ipanema, no Rio de Janeiro — Foto: Reprodução/Acervo Lucinha Araujo
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Cazuza em 1958, ano em que nasceu, em seu primeiro carnaval, no colo da mãe, em Vassouras, no interior do Rio de Janeiro — Foto: Reprodução/Acervo Lucinha Araujo
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Cazuza e Lucinha Araujo, em 1978 — Foto: Reprodução/Acervo Lucinha Araujo
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Cazuza aos 20 anos com o pai — Foto: Acervo Lucinha Araujo
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Cazuza, Ney Matogrosso e Ney de Souza Pereira — Foto: Antônio Nery
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Cazuza no hospital, em Boston, escrevendo poesia, em 1989 — Foto: Reprodução/Acervo Lucinha Araujo
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Cazuza aos 21 anos com sua Pentax: estudante de fotografia nos EUA, 1979 — Foto: Reprodução/Acervo Lucinha Araujo
Publicações organizadas por Ramon Nunes Mello desvelam facetas múltiplas do cantor
Com curadoria de Ramon Nunes Mello e o olhar sensível de Lucinha, a exposição une tecnologia — com inteligência artificial e hologramas — e um acervo inédito e cuidadosamente preservado. Roupas de palco, manuscritos, cartas pessoais, fotos raras e documentos originais compõem o roteiro dessa viagem por uma década que marcou gerações e transformou a música brasileira.
— Tivemos apenas quatro meses para montar a exposição, e seria impossível fazer a curadoria se eu não tivesse feito os livros “Meu lance é poesia” e “Protegi teu nome por amor”. Reunimos acervo do Cazuza e de seus amigos, muitos itens raros. A mostra tem o disco que ele autografou para o Ney (Matogrosso), sua mobília, máquina de escrever, a bandana que ele usou no Rock in Rio, um álbum de fotos de sua internação em Boston (EUA), uma foto que ele fez do Ney no palco, a primeira fita demo do Barão Vermelho e até a capa da revista Veja que gerou tanto mal-estar que causou uma internação. Acho que a verdadeira exagerada é a Lucinha, que tapa esse buraco da ausência do Cazuza com a memória. Ela é uma grande entusiasta do filho. São mais de 500 fotos de 50 fotógrafos. Vai ser um deleite para quem conhece o Cazuza e uma imersão para quem não conhece — adianta o curador.
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Uma das fotógrafas que cederam os direitos das imagens que fez de Cazuza para a mostra é Cristina Granato.
— Foi uma honra fotografar o Cazuza. Ele frequentava muito o Baixo Leblon, tocava piano e fazia uma bagunça. Era uma pessoa elétrica. Para mim, sempre foi uma coisa muito boa fotografá-lo, nunca foi difícil — diz ela.
O Leblon, bairro que respira o legado do artista, não foi escolhido por acaso. Foi ali, entre as ruas arborizadas e a efervescência cultural da Zona Sul carioca, que Cazuza viveu, amou e criou. A exposição está instalada onde o cantor viveu seus anos mais intensos.
— Em 1985, pouco antes da apresentação no Rock in Rio, encontramos o Lobão no Real Astoria, um piano bar. O Cazuza queria mostrar para o Lobão como tinha ficado a música “Mal nenhum”, que os dois tinham composto juntos. Eu toquei o piano, e ficamos ali. Foi uma noite inusitada e divertida, e quem estava ali pôde curtir — lembra Maurício Barros, do Barão Vermelho.
A Zona Sul foi mais do que cenário para Cazuza. A Pizzaria Guanabara, ponto de encontro de artistas, músicos e amigos, ganhou uma sala especialmente dedicada a ela na exposição. Ali, o visitante é convidado a interagir com depoimentos em vídeo de figuras que fizeram parte da vida do cantor, como Ney Matogrosso, Gilberto Gil, Frejat, Bebel Gilberto e Sandra de Sá. Essa experiência oferece um mergulho afetivo nas histórias por trás das canções e da personalidade de Cazuza.
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Em um dos trechos, Gil diz:
“Ele chegava e colocava logo o peito, tomava seu espaço, falando com quem estivesse numa mesa. Era uma pessoa muito particular. Ninguém foi tão eloquente quanto ele naquelas vivências, naquele momento e naquela cultura que se propagava ali — a coisa dos boêmios e contestadores. A primeira lembrança que tenho do lado artístico e poético dele foi quando Caetano me perguntou se eu o conhecia, se eu já tinha ouvido, e disse: ‘Preste atenção, é muito especial’. Foi inevitável que eu desenvolvesse uma amizade. Fiquei muito interessado pelo compositor, cantor e poeta. Ficava intrigado com a originalidade dele — essa coisa de recortar com muita exatidão o pensamento (…). Mesmo já doentinho, era dedicado ao ofício, muito cioso daquela condição de intérprete, autor e criador excepcional que era. E, mesmo num momento de maior debilidade, ele juntou tudo — as características da sua personalidade — e se tornou ainda mais enfático no jeito de esculpir os versos com as pedras das palavras, no fluxo suave e etéreo da canção (…).”
Ajuda para criar Circo Voador
Da infância em meio ao teatro e ao circo até os palcos como vocalista do Barão Vermelho e o voo solo que marcou a música nacional, a exposição é uma crônica visual e sonora. As nove salas percorrem desde os primeiros passos como Agenor Caju até a fase em que se tornou um artista marcado por sua irreverência.
— Cazuza tinha uma relação muito íntima com a criação do primeiro Circo Voador, no Arpoador. Ele e os amigos se mobilizaram para comprar a primeira lona e, com todo esse envolvimento dele, a história do Circo se aproximou da do Barão Vermelho. Nos dias de show, a gente saía da Praia do Leblon e ia andando até Ipanema, distribuindo as filipetas com as informações do nosso show, para anunciar que a gente ia tocar naquela noite. Dava certo, aparecia uma galera muito boa — lembra Guto Goffi, baterista do Barão Vermelho.
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Entre os destaques das salas também está a recriação do camarim do último show no Canecão, onde Cazuza mostrou sua maturidade artística, consciente de que o tempo não para. A efervescência da mídia, sua presença nos programas de televisão e o espírito inovador ganham vida em ambientes que dialogam diretamente com o público e propõem uma experiência que vai além da contemplação, estimulando o envolvimento emocional.
— Cazuza nos inspira a enxergar a vida com mais coragem, irreverência e arte — resume Fernando Ligório, CEO do Grupo 4ZERO4, responsável pela realização da exposição.
No Leblon aconteceram muitos de seus encontros e desencontros, as noites em claro, as composições e os diálogos que alimentaram sua obra. Raimundo Avelino De Souza, que hoje trabalha na Ferro e Farinha da Rua Dias Ferreira, costumava atender Cazuza na Pizzaria Guanabara. Ele diz que o artista marcou sua vida e deixou muitas memórias.
— O Cazuza ia lá quase diariamente. Às vezes ele levantava, dizia que ia embora e que não ia pagar nada. Aparecia no dia seguinte e perguntava quanto estava devendo. Antes de ele falececer (em 1990), a mãe o levou para se despedir da gente. Chorei muito. Quando eu o conheci, ele era um garotão, bonitão, e estava ali muito debilitado, mas fez questão de vir falar com a gente. Ele era muito divertido, pagava a conta das pessoas, conhecia todos os funcionários; tem muitas histórias boas dele. Quando o Cazuza fazia um pedido, ele se levantava e ia até a cozinha para pedir para capricharem. Deixou muita saudade. Falei para ele que vamos nos encontrar lá em cima — conta Souza.
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Em Ipanema, Cazuza curtia a praia em frente ao Posto 9. Costumava ir de bicicleta, encontrava os amigos, tomava cerveja gelada, comia um famoso pão de queijo da época e jogava frescobol.
— Cazuza se sentia em casa na Zona Sul. Ele nasceu em Ipanema, morou no Leblon por anos e depois voltou para Ipanema. O Arpoador era seu quintal; ia diariamente. Amava a praia no Posto 9 e curtia as noites no Baixo Leblon com os amigos — afirma Lucinha.
Foi na Praia de Ipanema que Ney Matogrosso e Cazuza se conheceram, em 1979. Em uma entrevista, Ney contou que uma amiga chegou acompanhada do artista, e ele perguntou quem era “esse pivete”, referindo-se a Cazuza. Na época, Ney tinha 39 anos; e Cazuza, 18.
Em dos trechos de seu depoimento para a exposição, Ney conta:
“Cazuza não está apagado dentro de mim. Toda hora alguém fala de Cazuza comigo — e não é só agora, sempre falaram. Quando eu penso nele, sinto uma coisa boa. Não tem essa coisa de morte, de se afastar, não. O sentimento fica. Tenho afinidade com o pensamento dele. A última coisa que gravei foi ‘O tempo não para’. ‘Poema’ foi gravada antes, mas agora é sucesso de novo. A música que gravei do Cazuza que mais faz sucesso nas plataformas foi essa. Quando eu a canto no show, todo mundo chora. Eu fico vendo as pessoas chorando e penso: ‘Gente, o que está acontecendo?’ Já ‘Pro dia nascer feliz’ é uma festa, todo mundo dança. Cazuza nunca foi esquecido, do primeiro dia do Barão Vermelho até hoje. Acho muito interessante dar mais informação sobre ele. Já são outras gerações, a coisa se transformou, mas é bom ter mais informação sobre ele na roda.”
Cazuza tem também uma história com o Teatro Ipanema, onde estudou teatro e participou de montagens no final da década de 1970. Em 1987, apresentou naquele palco o álbum solo “O poeta está vivo”, da turnê “Só se for a dois”.
No Morro da Urca ele se apresentou sozinho e com o Barão Vermelho. No Canecão, cantou em 1985 e fez seu último show, em outubro de 1988, que virou o disco “O tempo não para”.
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Os ingressos para a exposição estão disponíveis no site oficial cazuzaexposicao.com.br, com preços a partir de R$ 40. O ingresso social (R$ 50) é vendido somente na bilheteria. A mostra poderá ser vista de segunda a sábado, das 10h às 22h; e domingos e feriados, das 13h às 21h.
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